sexta-feira, 20 de março de 2009

Sobre a desvalorização política da habitação social e a "valorização imobiliária"

O Paulo Pedroso toca agora numa questão que constitui, porventura, a questão chave das políticas sociais urbanas dos próximos tempos: a questão do alojamento social.

A face mais visível das desigualdades sociais urbanas das nossas cidades (particularmente das grandes regiões metropolitanas) é a 'ghetização' da habitação social. O país reproduziu nas últimas décadas opções de alojamento social que noutros países europeus já tinham revelado os seus efeitos. Apesar das recomendações de todos os estudos, os nossos autarcas hipotecaram o futuro em favor da lógica eleitoralista mais primária da entrega de casas para a fotografia, sem atender aos erros do modelo de realojamento que estavam a adoptar: a segregação de grupos sociais com problemática integração social, acrescentando problemas, por essa via, onde eles já existiam.

A questão tem de ser analisada nas suas fundações e essas remetem para a questão da formação dos preços do solo urbano e de como os poderes públicos (centrais e locais) têm jogado com esse factor na sua produção de cidade, ao longo das últimas décadas. O que exige denúncia é o modo como políticos e partidos de todos os quadrantes utilizaram os solos urbanos nas suas estratégias de investimento, jogando como players privados, e com estes, na captação de capitais para a promoção de obra visível e geradora de capital político-eleitoral.

O que merece denúncia é, particularmente, o papel de promotor imobiliário desempenhado por autarcas de esquerda e, curiosamente, daqueles que são os maiores inimigos do mercado em prol dos pobres e explorados.

O caso de Almada é, deste ponto de vista, digno de um case study. A 'ghetização' foi o paradigma eleito. Mas, se olharmos para Lisboa, vemos, apesar de tentativas recentes de corrigir esse erro, a concentração de mais de 60% do alojamento social em apenas três freguesias, das 53 que compõem o município.

A edificação do alojamento social em áreas urbanas de solos a custos mais reduzidos e em construções densificadas reduz os custos económicos mas agrava os custos sociais. Do mesmo passo agrava a segregação de áreas já segregadas, reforçando as desigualdades urbanas. Claro que o reverso desta moeda é a deliberada libertação de terrenos mais valorizados para os colocar no mercado privado e jogar o jogo do investimento imobiliário. Se podemos considerar esse jogo legítimo da parte do mercado, já da parte dos poderes públicos, ele é, para dizer o mínimo, obsceno.

Corrigir estes erros não será tarefa facil para os autarcas vindouros, mas constitui-se no imperativo de uma nova política urbana, que reduza significativamente as desigualdades sociais e urbanas e procure evitar o 'barril de pólvora' que o trabalho autárquico, com a cumplicidade da administração central, edificaram nas nossas grandes cidades nas últimas décadas.

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